Quem me conhece sabe que algumas das minhas
paixões literárias são as histórias e lendas da História de Portugal, os nossos
contos populares, a mitologia greco-romana e acima de tudo, o Ovídio das
Metamorfoses.
Há tempos atrás, pediram-me que juntasse tudo
num pequeno conto… mas o que têm essas coisas tão díspares em comum? A tradição
oral, a intemporalidade, o encantamento…
Deixo-vos com O pajem alcoviteiro [de Alcobaça]…
Conta-se que no reinado de D.Afonso IV, vivia
um pajem, rapaz muito alcoviteiro…
As suas funções extravasavam em muito as de um
pajem, pois estava sempre com os seus mexericos, a arranjar grande confusão
entre os fidalgos do reino. Ouvia aqui, acrescentava ali e repetia amiúde, acolá.
Adorava perseguir o príncipe D. Pedro e a sua
bela amada Inês, até à Fonte dos Amores e deliciava-se escutando, escondido
entre os arbustos, as juras de amor trocadas entre os amantes. Depois, a troco
de alguns reais, ia correndo contar aos fidalgos de D. Afonso IV, tudo o que
vira e ouvira. Estes últimos, logo aproveitavam para conjurar contra os amores
proibidos de Pedro e Inês, a bem da nação, claro… como se ódios, violências e
morte, pudessem se sobrepor a tão grande amor!
Uma bela manhã primaveril, estava o pajem alcoviteiro
atrás da parelha de apaixonados, quando a sua curiosidade repara num poço que
havia meio dissimulado entre as flores, na quinta junto ao Mondego, cenário dos
encontros clandestinos.
Aproxima-se o pajem do poço e neste debruçando-se,
atraído pela imagem meio distorcida, contudo bela, pareceu-lhe ver um jovem, lá
no fundo, mais ou menos da sua idade.
Resolveu então gritar-lhe: - Olá!! e logo julgou que alguém lhe respondia: -
Oláaaaaa! Inclinou-se um pouco mais e catrapum – caiu dentro do poço, tal Frei
João dentro do caldeirão!!
Tal como se formos à cozinha do Mosteiro de
Alcobaça visitar, se formos com cuidadinho… escondido no caldeirão, lá estará
Frei João a espreitar! também se visitarmos a Quinta das Lágrimas, ainda hoje
parecer-nos-á ecoar um jovem - Oláaaaa!
Moral do conto: Coitado do alcoviteiro, a
curiosidade acabou por enredá-lo na sua própria teia.
Julho de 2014
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