domingo, 16 de novembro de 2014

Sura (bebida tradicional Moçambicana)




Homem a recolher líquido para fazer sura (bebida fermentada da seiva da palmeira, de teor alcoólico).
Fotos gentilmente cedidas por Yazald Chavana Chavana.

19-10-2014

Mousse de chocolate com coco

Aos meus adorados primos, pela inesquecível infância dourada.
Que os nossos destinos permaneçam entrelaçados para sempre.

Paulinha não tinha irmãos de pai e mãe, mas tinha irmãos de coração. E o pai destes, era também, de alguma forma, seu pai.

Tio Câmara, era uma figura carismática, aprumadamente enquadrado na paisagem de então. Dele, Paulinha recordava-se bem das vestes a lembrarem tempos coloniais, sempre muito elegante e perfumado. Apesar das tradicionais cabedulas[i], balalaica[ii] e meias altas, tudo rigorosamente engomado, ostentava sempre um elegante e colorido lenço ao pescoço (um foulard masculino) que lhe dava um toque very dandy. Toda esta mise en scéne sob um sol tórrido com elevado grau de humidade.

Não só tio Câmara era grande, forte e alto, como grande era também o seu carro, o inconfundível Mercedes-Benz [Paulinha, não se recordava da cor] com a sua enorme roda, a fazer de volante.

Sentada, em cima dos joelhos do seu adorado tio, Paulinha, nem por isso chegava aos pedais da majestosa viatura, mas sob orientação daquele, girava a gigante roda, conferindo-lhe a falsa sensação de conduzir os caminhos do seu próprio destino.

- O que querem, hoje, tomar os meninos? – Dizia tio Câmara com a sua voz de tenor [na realidade, a voz era um dos seus múltiplos atributos].

- Mousse de chocolate! – Dissera prontamente Paulinha.

- Coca-cola! – Disseram em uníssono os primos Octávio e Filomena.

- Pois mousse de chocolate, seja! – Assegurava tio Câmara. – Vamos ao Chuabo!

Fosse qual fosse a resposta, Chuabo, ou lá como se chamava o snack-bar, seria sempre a resposta dos milhões.

Como esquecer, o mais moderno e emblemático café-snack-bar da Zambézia? Aquele que pertencia ao grande Hotel Chuabo de Quelimane… ao lado do não menos emblemático, prédio do Monteiro & Giro, de sete andares?! Recorde-se que estávamos no início dos anos 70, algures no coração da Zambézia… não, não era mato, era a cidade de Quelimane, a cidade de Paulinha, nos seus tempos áureos.

O café Chuabo era um dos locais predilectos do tio Câmara, pois constituía a oportunidade de rever e confraternizar com os seus amigos Bôeres (Sul-Africanos), também estes “fardados” com calções e camisas de caqui, imaculadamente engomados e meias altas.

Partilhavam os mesmos gostos, como a caça grossa, a aviação, o whisky on the rocks ou com soda…

- Hello Johnny, my friend! – Dizia tio Câmara a um dos seus amigos…

É verdade, algures num local recôndito da África oriental, mais precisamente em Moçambique, algures no coração da Zambézia, em Quelimane, terra de Paulinha, encontrava-se um dos mais luxuosos cafés dos anos setenta, com ar condicionado (nada de ventoinhas no tecto à boa maneira colonial), pasme-se – luzes verdes néon! whisky do bom (só este tinha direito de admissão), e a mais maravilhosa mousse de chocolate com coco que Paulinha alguma vez experimentara…

Não, não era o café Chuabo do Hotel Chuabo, era apenas o paraíso na terra, a avaliar pelo calor insuportável que se fazia sentir lá fora. (continua)


Novembro, 2014.




[i] Calções
[ii] Camisa masculina, larga de tecido fresco, com vários bolsos.